Acéfalos: novembro 2006

segunda-feira, novembro 20

Dia da Consciência Negra - Homenagem a Zumbi

Zumbi (1655-1695) nasceu num dos mocambos que constituíam o quilombo dos Palmares. Foi capturado, recém nascido, em uma das muitas expedições militares contra Palmares e foi dado de presente a um padre, ganhando de batismo o nome de Francisco. Com quinze anos de idade fugiu com um grupo de escravos de volta para o quilombo dos Palmares, livra-se do antigo nome, passando a ser Zumbi, que significava "Deus da Guerra", "Fantasma Imortal" ou "Morto Vivo". Aos dezessete anos já é chefe guerreiro derrotando a quinta expedição armada contra Palmares. É nomeado rei de Palmares quando insurge-se contra um duvidoso acordo de paz feito entre Ganga Zumba, primeiro rei do quilombo, e o rei de Portugal em 1678. Zumbi não acreditava que os brancos honrassem os termos da paz, insistindo em que a luta era a única forma de continuarem livres. Só é morto em 1695, delatado por um dos chefes palmarinos de sua confiança.

Quilombo significa "sociedade guerreira". O quilombo dos Palmares durou praticamente um século, foi o maior e mais duradouro dos muitos que existiram na América, representando um estado negro dentro do estado escravagista brasileiro. Ocupava uma área de 27.000 quilômetros quadrados, equivalente a Alagoas, era constituído por nove mocambos ou povoados com um total de 20.000 habitantes em uma região extremamente fértil, banhada por vários rios e fauna e flora extremamente diversificadas. Tudo era produzido de forma comunitária, além da agricultura praticavam o artesanato e a metalurgia. Por possuir um ideal comunitário extremamente forte, possibilitando um igualitarismo que o sistema colonial negava e por ter-se formado sob a inspiração do sentimento de liberdade , Palmares representava um ameaça aos senhores de engenho e precisava ser destruído. Depois de sofrer nove expedições armadas (entradas) durante quase cem anos, Palmares é destruído por Jorge Velho e seus bandeirantes.

A história de Zumbi e do quilombo dos Palmares é mais um exemplo entre muitos na história da resistência à escravidão no Brasil. Foi o primeiro grande ato de rebeldia contra o sistema escravista colonial e o poder em nossa história. Palmares nos motiva a lutar contra o "mito da democracia racial", do "negro dócil", Zumbi representa o negro rebelde que lutou pela liberdade até a morte. Ontem Zumbi lutou contra os interesses dos poderosos de sua época, hoje ele vive em todos aqueles que lutam contra a escravidão capitalista, que ainda mantém os negros e a maior parte do mundo presos às correntes da exclusão social.

O mundo ocidental evoluiu às custas das riquezas da Africa e do trabalho braçal do negro. Até hoje vemos resistências em que os excluídos, em sua maioria negros, consigam ter as mesmas oportunidades que os demais. Grande parte dessas oportunidades passam por políticas públicas e de educação ao povo de que a diversidade da raça humana não deve ser motivo de segregação.

Ainda hoje ouço as frases: "O preto tem que saber o seu lugar", "Os pretos tem que sofrer mesmo", "Não quero meu filho casando com uma preta, imagine o que vão falar? E os filhos então, vão sofrer preconceito pro resto da vida".

O Dia da Conscîência Negra foi criado como intuito de lembrar aos negros de seu passado, de todo o mal que acometeu a sua raça, de todos aqueles irmãos de raça que morrem de fome na Africa apesar de terem abaixo do solo riquezas. Ter consciência da humilhação, mesmo depois da abolição.

Para que resgatem sua auto estima, como uma raça forte, que conseguiu sobreviver mesmo depois de séculos de exploração. Para que resgatem sua cultura, sua dança e suas artes marciais. Para que resgatem sua religião se permitindo aos chamados de seus Orixás.

terça-feira, novembro 7

Política Pública versus Poder de Polícia

Quando a polícia atua, há quase sempre uma comoção social em prol da proteção de quem está sendo alvo da ação policial. Parte por se imaginar na mesma situação, parte por se identificar mais com o civil do que com o policial. Parte por um imaginário de que a polícia age sem critérios, apenas para abusar do poder.

Mas acontece que o poder de polícia ocorre quando a política pública falha, e o que vemos na nossa sociedade é que a política pública está ausênte do cotidiano do povo, por exemplo:

Se não há política pública para assentamento de sem terra e nem políticos que mediem negociações, haverá necessidade da polícia entrar em ação.
Se não há política pública para educar as crianças nem dar lazer a elas, haverá necessidade da polícia entrar em ação.
Se não há política pública para empregar a população, haverá necesidade da polícia entrar em ação.

Na história brasileira há uma cultura do uso da força como forma de manter a Ordem. Em várias passagens, vimos a truculência como forma de combate às insurgências. Poderia dizer, desde o genocídio do povo indígena, passando por Canudos e terminando Eldorado de Carajás. Durante o "Brasil Escravagista" o uso da força para manter "na linha" os escravos era prática comum... É, tem certas coisas que ficam marcadas no inconsciente coletivo de uma nação, e nem percebemos que estamos tão acostumados, que não lutamos para ter um país que se preocupa com o bem estar de seus frutos.

É fácil culpar a polícia por todos esses atos, mas deixamos de refletir que não houve um interesse de realizar uma ação diplomática (política) para se resolver questões que não precisaria do "poder de polícia". Depois fica fácil se lamentar. E quando se lamenta, joga-se a instituição, que serve para proteger o povo, contra o povo.

E ainda, se não bastasse, existe a glamourização da bandidagem. Tem bandido que é gente fina, dá presente pra criançada da comunidade, ajuda comprar remédio para quem está doente, ou seja, faz o papel do poder público. Quando noticiam algum roubo espetacular ou até um assassinato, muitas vezes a mídia mostra o bandido como "herói".

Conforme disse o Presidente do Fórum de Segurança Pública no Observatório da Imprensa, é preciso que a mídia seja mais isenta com relação a instituição "Polícia", deve mostrar as notícias boas e as ruins quanto à corporação. Deve-se criar uma identificação da polícia como órgão de suporte à sociedade e não de repressão.

quarta-feira, novembro 1

Teoria do país dividido

Após a vitória de Lula para a presidência, os especialistas em política, sociologia
e jornalistas em geral vem levantando a bola de que existe dois Brasis diferêntes.

Primeiro, a interpretação é erronea pois discrimina a população das regiões Norte e Nordeste por uma mídia sectária vivendo confortavelmente no Rio ou em São Paulo. Os boçais acima citados publicaram que existe o Brasil dos informados intelectualizados, inteligentes) e o Brasil dos grotões da nação (pobrezinhos, ignorantes). Na realidade a votação demonstrou quem quer um Brasil de distribuição de renda ou um Brasil de concentração de renda.

Segundo, eu acredito que não há dois Brasis e sim multiplos. A votação de Lula foi esmagadora nas regiões Norte e Nordente e por conta disso houve a idéia de divisão do país.

Na realidade, ninguém se lembrou que a diversidade de nossa nação, que é continental, ultrapassa a fronteira política. No Rio Grande do Sul, vemos um país diferente em muitos aspectos de qualquer outra parte do país, e mesmo assim mostrou que está mudando politicamente. Há duas décadas PT e PMDB vinham se revezando no governo, esta eleição houve outra alternancia, voltada para o PSDB, sem tradição em cargos executivos. Na BA, pela primeira vez na história, teremos um governador de "esquerda", mesmo sendo um estado oligárquico e coronelista. Em SP o caso foi mais atípico pois o candidato vencedor está mais presente no imaginário do povo como ministro, candidato a presidente, prefeito, facilitando mais ainda sua vitória.

Concluindo, analisar a eleição de modo tão genérico e superficial beira o preconceito e demonstra que na realidade o ignorante é aquele que publica a primeira idéia que vem em sua cabeça sem ter conhecimentos dos fatos sociais.

Terceiro, se em parte a nação retrocedeu, em parte ela avançou. Retrocedeu pois consagrou a cleptocracia, avançou pois se livrou dos grilhões da oligarquia.

Sobre a cleptocracia (governo de ladrões consagrado pelo povo) o país agiu como marido que é traído pela mulher e sempre a pega com o amante (já dizia Tato). Uma coisa é aparecer um escândalo, outra coisa é toda semana estampar um escândalo diferente na mídia. Por mais que o país tenha avançado, não justifica o fato de tantos podres.

Sobre a independência. Os Estados do Nordeste que desde o Brasil Colônia é governado pelas mesmas famílias, este ano vimos uma reviravolta histórica. Foi a consagração do povo sobre a oligarquia. Os Estados da BA e MA trocaram o coronelismo pela democracia. PE se firma como um Estado socialista repetindo a experiência de partidos de "esquerda".

Foi uma eleição no ambito federal marcada pela falta de opção e de um quadro medíocre de candidatos. Nos Estados, cada um teve sua história, difícil de se fazer um retrato fiel das disputas com suas particularidades históricas.