Acéfalos: Psicopatas Light

segunda-feira, julho 17

Psicopatas Light

Acabou a copa e a ciranda de feriados. Os ataques do PCC estão amornando por enquanto e quem vai alavancar o ibope das emissoras até a campanha eleitoral começar de fato? Resposta: Suzana Von Rithconsoante.

A psicopata patricinha que matou os pais com seu namorado pobretão (a Dama e o Vagabundo).

Qual a capa da revista Superinteressante no mês: Psicopata.

Já que o assunto está em voga vou aproveitar para requentar um texto do Arnaldo Jabor de 15/06/2004 que posso considerar quase um ensaio sobre a neo psicopatia e a evolução da espécie humano no novo milênio.

Vou colocá-lo na íntegra e espero que me perdoem por se tratar de um texto datado mas que dá uma visão completa da alma humana na sociedade ocidental:

"Os psicopatas chiques estão chegando"

Tenho assistido à novela Celebridade com fervor. Adoro. Principalmente pelas personagens que as grandes atrizes Claudia Abreu, Deborah Evelyn e Ana Beatriz Nogueira encarnam. Elas nos fascinam pela ausência de culpa em seus corações e mentes. Antigamente, nos romances, nos filmes, nos identificávamos com as vítimas; hoje, nos fascinamos com os cruéis. Não torcemos mais pelos mocinhos - torcemos pelos bandidos. A verdade inapelável é que os heróis dessa novela são os malvados. É um "neo-Vale-Tudo", desse autor que influenciou até o impeachment do Collor, com Anos Rebeldes, lembram? Em Celebridade, reparem que os bonzinhos têm até uma certa inatualidade careta. Maria Clara foi até alvo de apelidos de Maria Chata, por ser muito correta, bem-intencionada. Quem nos fascina são os filhos da p.... Por quê? Bem, além da genial interpretação das três atrizes, os psicopatas são nosso futuro. Eles encarnam a vida moderna, cada vez mais, pois estamos sendo pautados pela luta absurda de dois psicóticos: Osama de um lado ccom seu exército de estúpidos com o rabo para Deus e, do outro, a mesma coisa com Bush e seus malucos. Nossa esperança com os USA virou pó.

Antes, pensávamos: os USA são o máximo! Eles fazem Boeings, remédios, tecnologia, satélites, eles são democratas e competentes. Bush nos fez desamparados. Como acreditar em harmonia futura, em bom senso, em arte, em cultura, em filosofia, depois desta revolução da estupidez?

Dentro de casa, nesta era Lula, vivemos uma democracia de massas com o gigantesco aluvião de boçalidade que nos atinge. Com a crise das utopias, agravada pela decepção com o governo, com a ausência de ideologias possíveis, de sindicatos e partidos políticos, com o desemprego e o descaso pela miséria, com a exposição brutal de um escândalo por dia, de vampiros, gafanhotos, "laranjas" e fantasmas, com a propaganda estimulando o sexo sem limites, com a ridícula liberdade para irrelevâncias, temos o indivíduo absolutamente sozinho. Isso leva a um narcisismo desabrido que evolui para a psicopatia. Somos hoje free lancers sem limites morais em luta para um lugar ao sol. Ou pela fama ou por um golpe na praça - ou ricos ou famosos.

Diante do espetáculo de sordidez e violência, diante dos cadáveres, da miséria, do cinismo, somos levados a endurecer o coração, endurecer os olhos, endurecer o "pau", em busca de um funcionamento "comercial" ou seremos descartados, tirados "de linha" como um carro velho. Essas condições sociais e culturais, na mídia e no ar-do-tempo, vão parindo legiões de psicopatas, muitos deles disfarçados de chiques ou light. São os loucos de hoje e do futuro que estão chegando. Falo isso, porque as doideiras são históricas também. Já houve a época da histeria com a repressão sexual vitoriana, houve a época do romantismo utópico onipotente, a paranóia do entreguerras. Hoje, respirando num mundo sem lei, sem ética, surge o psicopata. E veio para ficar.

A novela do Gilberto Braga acerta em cheio nessa doença. O psicopata, light ou chique, que não faz picadinho de ninguém, que não é serial killer, tem, no entanto, as mesmas molas que moviam até o esquartejador. É fácil reconhecer o psicopata. Ele não é nervoso ou inseguro. Parece muito sadio e simpático. Ele em geral tem encanto e inteligência, forjada na razão pura do interesse sem afetividade ou culpa para atrapalhar. Ele tem uma espantosa capacidade de manipulação dos outros, pela mentira, sedução e, se precisar, chantagem. Não se emociona nem tem compaixão nenhuma pelo "outro". O que mais impressionou nas fotos da prisão no Iraque foi o sorriso luminoso das mulheres torturando os presos. Questionado ou flagrado, o psicopata não se responsabiliza por suas ações, sempre se achando inocente ou "vítima" do mundo, do qual tem de se vingar. Ele, em geral, não delira. Suas ações mais absurdas e cruéis são justificadas como "lógicas", naturais, já que o "outro" não existe para ele. Ele não sente nem remorso nem vergonha do que faz (o que nos dá imensa inveja). Ele mente compulsivamente, muitas vezes acreditando na própria mentira, para conseguir poder. Seu fraco "amor" aparece como posse ou controle. Não tem capacidade de olhar para dentro de si mesmo. Não tem insights nem aprende com a experiência, simplesmente porque acha que não tem nada a aprender.

E esse comportamento está deixando de ser uma exceção. O psicopata é um prenúncio do futuro, quando todos seremos assim para sobreviver. A velha luta pela ética, pela paz, solidariedade está virando uma batalha vã. Esses sentimentos humanos só foram possíveis também historicamente. Raros foram os momentos em que vicejaram. Os chamados comportamentos humanos estão se esvaindo na distância. O que é o humano hoje? O humano está virando apenas um lugar-comum para uma bondadezinha submissa, politicamente correta, uma tarefa inócua para ONGs.

O humano é histórico também. Talvez não haja mais lugar para esse conceito, que é mutante. Somos máquinas desejantes que nos transformamos com o tempo e a necessidade.

Como nesta novela balzaquiana, oportuna e política do Gilberto, vemos que o Brasil está se dividindo entre babacas e psicopatas. Antes, os psicopatas tocavam num mistério que não queríamos conhecer. Tínhamos medo deles. Hoje, os babacas estão ficando com uma inveja danada dos psicopatas, por sua eficiência, rapidez e falta de escrúpulos. Estão vendo que essa antiga doença vai ser uma virtude no futuro. Estão vendo que terão de ficar loucos como eles para sobreviver. Em breve, seremos todos psicopatas.

2 Comments:

Anonymous Anônimo said...

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Anonymous Anônimo said...

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